O debate presidencial
transmitido na noite passada pela Record foi uma espécie de luta de boxe na
qual Marina Silva entrou com a cara. Dilma Rousseff esmurrou-a impiedosamente.
Aécio Neves desferiu-lhe um par de jabs. Até a nanica Luciana Genro levou-a às cordas.
No final, a parte da anatomia de Marina que mais apareceu no vídeo foi seu
queixo de vidro.
Anabolizada
pelo treinamento do marketing, Dilma foi para cima de Marina já na primeira
pergunta. “A senhora mudou de partido quatro vezes, mudou de posição de um dia
para outro em problemas de extrema importância, como a CLT, a homofobia e o
pré-sal. Num debate da Bandeirantes, a senhora disse que tinha votado a favor
da criação da CPMF porque achava que era o melhor que se podia ter para a
saúde. Qual foi mesmo o seu voto como senadora?”
A indagação de Dilma ecoava uma propaganda que
sua campanha veiculara na tevê ao longo do domingo, como quem prepara uma
emboscada. Escorada no noticiário, a peça demonstrava que, diferentemente do
que dissera, Marina votara contra a proposta de criação da CPMF em duas
ocasiões. Como as votações ocorreram em dois turnos, ela dissera “não” ao
chamado imposto sobre o cheque quatro vezes.
Sem poder negar o inegável,
Marina ajustou a declaração que fizera antes. Em verdade, ela endossara a CPMF
na votação da proposta que criou o Fundo de Combate à Pobreza, uma iniciativa
do ex-senador pefelê Antonio Carlos Magalhães. “A composição do fundo seria:
recursos da CPMF e dos impostos sobre cigarro”, disse Marina no debate.
“Naquela oportunidade, [...] portanto, votei favoravelmente, sim. Eu e o
senador Eduardo Suplicy, mesmo com a oposição séria de várias lideranças do PT,
que à época diziam que eu estava favorecendo um senador de direita.”
Punhos em riste, Dilma foi à
réplica: “Candidata Marina, eu não entendo como a senhora pode esquecer que
votou quatro vezes contra a criação da CPMF. Nessas quatro vezes a senhora
votou não. Isso consta dos anais do Senado. Atitudes como essas produzem
insegurança. Governar o Brasil requer firmeza, coragem, posições claras e
atitudes firmes. Não dá pra improvisar. Então, candidata, me estarrece que a
senhora não lembre como votou quatro vezes contra a criação da CPMF.”
Abstendo-se de comentar os
votos contrários, Marina, por assim dizer, dobrou os joelhos: “Eu me
lembro exatamente quando votei a favor. Não tenho a lógica da oposição pela
oposição nem da situação raivosa, que não é capaz de dialogar em nome dos
interesses do Brasil. E nem da situação cega, que só vê qualidades mesmo quando
os defeitos são evidentes. Tive uma prática coerente a vida toda. Defendi, sim,
a CPMF para o fundo de combate à pobreza e é mais uma das conversas que o PT
tem colocado para deturpar o processo.” Tempo esgotado, cortou um dos apresentadores.
Marina vem dizendo que prefere o debate ao embate. Após assistir
à surra da noite passada, um de seus aliados disse que Marina talvez
devesse considerar a hipótese de entrar na briga de uma vez por todas. Sob pena
de morrer como uma transeunte inadvertida. Em política, quem se entrega ao
dilema shakespeariano (to
be ou not to be) raramente chega a ser.
Dilma foi aos estúdios da
Record orientada para esfregar na cara de Marina as mistificações que,
exploradas na propaganda eleitoral petista, puxaram-na para baixo nas
pesquisas. “Não se pode usar dois pesos e duas medidas”, fustigou Dilma noutra
passagem. “Qual é a posição da senhora a respeito dos créditos para os bancos
públicos, o chamado crédito direcionado subsidiado? A senhora sabe a quanto
monta esse crédito?”
Além de virar um ser que se
justifica a cada sílaba, Marina fez, de resposta em resposta, propaganda
involuntária dos programas expostos na vitrine eleitoral de sua antagonista:
“Eu não só vou manter o crédito dos bancos públicos para o Minha Casa, Minha
Vida, para ajudar a nossa agricultura a se desenvolver, como vou fortalecer os
bancos públicos. Isso é mais um boato que está sendo dito em relação à nossa
aliança, de que nós vamos enfraquecer os bancos públicos.”
Dias atrás, Marina chorou ao comentar
os ataques que o petismo lhe faz com o endosso de Lula. De tanto se queixar dos
boatos criados na usina de marketing de João Santana, a rival de Dilma acabou
se auto-fragilizando. Candidato que muito reclama de malandragens dos
rivais acaba soando como comandante de navio que se queixa do mar.
“O que vamos evitar é aquele
subsídio que vai para empresários falidos, meia dúzia de escolhidos para ser
campeões do mundo”, prosseguiu Marina. “…Esses, sim, não terão vez no meu
governo. Não vamos permitir que recursos do BNDES sejam usados por meia dúzia.”
E Dilma: “Interessante, porque
no seu programa consta justamente que a senhora vai reduzir o papel dos bancos
públicos.” Ensaiada, a discípula de João Santana tirou sarro de Marina: “Sei
que a senhora não sabe o montante dos créditos direcionados. É R$ 1,340 trilhão
de reais. Isso significa, candidata, que toda a estrutura do Brasil, a
produtiva e a social, está ligada a esse crédito.”
“Eu vou manter, sim, o crédito
direcionado…”, repisou Marina. “Isso está muito claro no meu programa. É mais
um dos boatos que estão sendo espalhados.” Um repórter perguntou quem decidiria
sobre a manutenção de programas sociais como o Bolsa Família num hipotético
governo Marina, ela ou seus assessores bem-nascidos?
“Quem vai decidir a manutenção
dos programas sociais do meu governo é a sociedade brasileira”, respondeu
Marina. Instado a comentar, Aécio Neves acionou os punhos: “No meu governo, serei
eu que irei decidir. E eu manterei os programas sociais, blá, blá, blá…”
Aécio continuou jabeando:
“…Vejo com certa estranheza a candidata Marina se queixar muito, hoje, das
ofensas, das calúnias e dos boatos que os candidatos de oposição sofrem, de que
vão acabar com esses programas sociais. Os boatos realmente existem, candidata,
mas sempre existiram. Existiram contra nós quando a senhora estava no PT. E não
me lembro, infelizmente, de nenhuma palavra da senhora contra esse tipo de
política que o PT continua praticando.”
A alturas tantas, Marina
dirigiu a Aécio uma questão sobre a matriz energética do país. Concordaram no
essencial: é preciso diversificar o modelo, adicionando a energia eólica, a
solar e a da biomassa. Mas Marina criticou a “falta de planejamento” que
vigorou nos governos do PT e também no do tucano Fernando Henrique Cardoso.
Aécio viu-se compelido a
defender o correligionário. Fez isso atacando: “A senhora cita governo Fernando
Henrique, que tinha um grande desafio: o desafio de domar a inflação, de tirar
o perverso imposto inflacionário das costas do trabalhador brasileiro. Lutamos
muito por isso, contra o PT. Isso aconteceu, lamentavelmente, num tempo em que
a senhora participava do PT.”
O marqueteiro Duda Mendonça
costuma dizer que o eleitor prefere ouvir propostas a testemunhar ataques. Por
essa teoria, a pancadaria pode se voltar contra o agressor. Responsável pelos
efeitos especiais do comitê de Dilma, João Santana, que já trabalhou com Duda, subverte
essa lógica. Até aqui, foi na base da pancada que ele puxou Marina para
baixo e melhorou os índices de sua candidata nas pesquisas.
Além do auxílio luxuoso de
Aécio, que tenta tomar o lugar de Marina no segundo turno, João Santana
contou com o reforço de Luciana Genro. “Tu tens dito que defendes uma nova
política”, disse a candidata do PSOL para Marina. “Mas teus economistas são
ligados ao PSDB… e tua campanha é financiada por bancos e empreiteiras. Como é
que tu vais fazer uma nova política com esses aliados.”
Marina levou um minuto e meio
para dizer que Luciana não entendia nada de nova política, que “está sendo feita
pela sociedade brasileira”. E sua interlocutora: “A nova política da Marina é
assim: ela recebe a pressão do agronegócio, cede e diz que nunca foi contra os
transgênicos. À pressão dos banqueiros, ela cede dizendo que vai dar autonomia
pro Banco Central. À pressão dos reacionários do Congresso, [...] ela cede e
joga na lata do lixo o seu programa de defesa dos direitos LGBT. Essa é a nova
politica da Marina. Mais velha do que a história.”
Nas cordas, Marina fez para a
nanica Luciana a mesma pose de vítima que faz para a peso-pesado Dilma: “A nova
política que eu pratico é exatamente para evitar esse tipo de atitude, que
espalha boatos, que espalha calúnias, sem nenhum compromisso com a verdade.
Isso é velha política.” Conteúdo do blog Josias de Souza
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Em Tempo:
Depois desse debate, não será surpresa para ninguém se
Aécio Neves voltar a ocupar o segundo lugar nas intenções de votos. O que o PT
torce e trabalha para que isso aconteça, uma vez que mais de metade do PSB num
eventual segundo turno marchará com Dilma Rousseff, levado pelo presidente
nacional desse partido, o cientista político Roberto Amaral, que não morre de
amores por Marina Silva. (Dom Severino)
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